Publicado originalmente no jornal Diário da Manhã.
Não dá para entender isso sem conhecer Zigmunt Bauman, o sociólogo polonês. Mas conhecer sua obra não basta, é preciso conhecer também Thomas Hobbes e o papel do Estado, conhecer também o surgimento do monetarismo na década de 60/70, e saber que o keinesianismo utópico foi engolido pela realidade predatória do capitalismo instintivo dos grandes conglomerados que se formaram a partir da criação do FMI na pequena cidade de Bretton Woods em 1944, onde o lastro econômico mundial foi modificado do ouro para dólar, o que levou a desgraça econômica para o mundo e enriqueceu sobremaneira os Estados Unidos da America no pós-guerra.
Assim fica difícil entender o tal do Black bloc, mas paciência é assim mesmo. Bauman fala sobre um novo conceito de sociedade sem valor moral – essa que nós somos, eu e você – onde eu tenho um deus e você tem outro. Esse deus que é de acordo com nossas necessidades. Nós somos líquidos, ou seja, maleáveis ao ponto de assumir as formas sociais segundo as potencialidades exigidas – escravidão branca incolor. A culpa disso são os erros do capitalismo no processo de aceleração da qualidade em detrimento dos valores morais. A sociedade tornou-se líquida, mas não o estado. Mais que nunca, o estado continua sólido e impermeável aos clamores sociais; o Estado enrijeceu ao ponto de não ser mais resiliente – jamais foi. A questão é o exacerbo.
Em resumo podemos dizer que o Estado não exerce mais seu papel de tutor dessa sociedade já quase falida e, o sujeito social encontra-se numa espécie de deserto existencial. Colabora bastante para nossa desgraça, a voracidade do Estado sobre esse sujeito social na forma de tributos. O Estado tornou-se inimigo de uma parte da sociedade, do grosso. Estamos ensaiando um processo de absorção socioeconômico semelhante ao dias de São Bartolomeu, com a diferença que não sabemos o que seja brioche e nem estamos na França. Nosso modelo de massacre foi Carandiru e nossa Bastilha, com a graça de Deus será, ainda, o Palácio do Planalto, me disse um mascarado. Há uma dicotomia crescente entre o representante e o representado brasileiro.
– O cidadão é refém do sistema, isso diz tudo.
Não há força social no individuo para lutar contra a usura que o sistema lhe impõe, o voto não basta. Com isso, a reação se torna instintiva e a violência começa a fermentar no âmago do povo culturalmente viável e deságua sobre: primeiro em tudo aquilo que representa as instituições, pois elas representam o poder e depois, em tudo que estiver ao alcance da mão.
O black bloc não é um grupo formado por vândalos, como quer a grande mídia, mas são pessoas com muita clareza em suas ações e um germe que está incubado na sociedade brasileira há séculos. Portanto, seminal do terrorismo contra-estado. Eles atacam instituições, bancos ou empresas que significam o capitalismo de rede e tudo que possua elo com o sistema – por enquanto.
Para se ter uma ideia do ovo de escorpião que está sendo chocado pelo petismo, a violência não pára e nem vai parar. Não há uma compreensão do Estado qual seja seu papel para com a sociedade. A idéia de poder pelo poder ensandeceu a política e o conceito de governo de coalizão em que o Governo copta partidos para sua sustentação, vai se tornando um trator que empurra o País a cada dia, para mais perto do barranco do abismo. Esse povo que se encontra com ódio do Estado, vai continuar dando tiro na cara de guarda de trânsito, vão espancar coronéis da PM, vão atacar juízes, promotores, políticos, bancos, transnacionais... Não demora começa a matança.
(Waldemar Rêgo, jornalista, escritor e artista plástico. waldemarregojr@gmail.com)
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