Artigo de opinião, publicado originalmente no jornal O Popular, de 24 de maio de 2013.
Na década de 1980, vários grupos de rock que se destacaram no Brasil. Entre eles a banda Legião Urbana. O grupo originário de Brasília foi responsável por um número considerável de sucessos musicais da época.
Uma de suas músicas, e que agora também virou tema de um filme, Faroeste Caboclo, tanto aponta para uma reflexão das relações sociais da cidade quanto expõe a trajetória cotidiana de um grande número de migrantes de baixa renda. São milhares de pessoas que vão buscar construir projetos de vida nas grandes cidades brasileiras.
A letra da música narra a saga de um migrante que sai de uma região pobre em busca de uma vida mais digna em uma cidade grande. Quem observa atentamente as estrofes iniciais percebe que elas sintetizam os típicos percursos dos migrantes brasileiros, em especial, de baixa renda.
O primeiro momento da saga de João de Santo Cristo está na saída do campo, “Deixou pra trás todo o marasmo da fazenda”. Evidente reflexo da ausência de possibilidades de crescimento e realização.
Em um segundo momento, existe a tentativa de se estabelecer em uma pequena cidade. Todavia, o retrato da maioria das pequenas cidades brasileiras é da inexistência de oferta de condições satisfatórias de vida para os seus cidadãos. O resultado é que as mesmas acabam também empurrando as pessoas para cidades economicamente mais dinâmicas.
O terceiro momento na vida do migrante é seguir para as cidades grandes, buscando entre uma e outra, o que se chama de “tirar a sorte”. Isto é, se estabelecer e assegurar a realização de seus projetos de vida dentro de condições mais satisfatórias.
Porém, a música vai mais além. Ela destaca que os processos migratórios também são acompanhados de práticas de violência e preconceitos. A violência policial está inscrita na frase “Quando criança só pensava em ser bandido,/Ainda mais quando com um tiro de um soldado o pai morreu”. Tal prática, como todos já sabem, no Brasil, tem transformado a própria polícia em um problema policial.
O segundo problema refere-se à ineficácia do sistema de ensino e ao fracasso do sistema punitivo: “Aos quinze, foi mandado para o reformatório /Onde aumentou seu ódio diante de tanto terror”. Para se chegar ao “reformatório” é porque a escola não emergiu como espaço da descoberta da vida e da cidadania.
O terceiro problema diz respeito ao preconceito étnico: “Não entendia como a vida funcionava discriminação por causa da sua classe ou sua cor”. Portanto, a música denuncia não apenas a condição histórica da manutenção dos negros como pessoas sem oportunidades por conta da cor, mas aponta ainda para uma dupla discriminação: a de classe social, como pobre, e a de etnia, porque negro.
Todavia, a passagem para uma cidade grande não significa mudança para uma vida melhor. Partindo do fato de que, no Brasil, o trabalho, historicamente, não representa uma possibilidade de ascensão social, o indivíduo desqualificado profissionalmente tem que trabalhar duro sem, contudo, conseguir se sobrepor às dificuldades, “E o Santo Cristo até a morte trabalhava / Mas o dinheiro não dava pra ele se alimentar”. Esse é um cenário cotidiano de muitos jovens (desempregados ou sub-remunerados). Em síntese, ao longo da música fica implícita as precárias situações da vida no interior brasileiro: um lugar sem oportunidades e, invariavelmente, sem leis.
Na sequência da música, o personagem central busca adquirir, por meio de trabalhos precários. Nesse ponto, temos uma reconstrução do cenário dos centros urbanos onde persiste o fenômeno da violência. A música termina com a morte do personagem João de Santo Cristo, o que denota uma derrota do migrante que ganha a vida na metrópole. Na música, ele é inteiramente tragado pela violência, pelo trabalho precário, pelas drogas. Diríamos ainda, sobretudo, pela ausência de políticas públicas que assegurem aos cidadãos uma vida digna, seja no campo ou nas grandes cidades.
Uma de suas músicas, e que agora também virou tema de um filme, Faroeste Caboclo, tanto aponta para uma reflexão das relações sociais da cidade quanto expõe a trajetória cotidiana de um grande número de migrantes de baixa renda. São milhares de pessoas que vão buscar construir projetos de vida nas grandes cidades brasileiras.
A letra da música narra a saga de um migrante que sai de uma região pobre em busca de uma vida mais digna em uma cidade grande. Quem observa atentamente as estrofes iniciais percebe que elas sintetizam os típicos percursos dos migrantes brasileiros, em especial, de baixa renda.
O primeiro momento da saga de João de Santo Cristo está na saída do campo, “Deixou pra trás todo o marasmo da fazenda”. Evidente reflexo da ausência de possibilidades de crescimento e realização.
Em um segundo momento, existe a tentativa de se estabelecer em uma pequena cidade. Todavia, o retrato da maioria das pequenas cidades brasileiras é da inexistência de oferta de condições satisfatórias de vida para os seus cidadãos. O resultado é que as mesmas acabam também empurrando as pessoas para cidades economicamente mais dinâmicas.
O terceiro momento na vida do migrante é seguir para as cidades grandes, buscando entre uma e outra, o que se chama de “tirar a sorte”. Isto é, se estabelecer e assegurar a realização de seus projetos de vida dentro de condições mais satisfatórias.
Porém, a música vai mais além. Ela destaca que os processos migratórios também são acompanhados de práticas de violência e preconceitos. A violência policial está inscrita na frase “Quando criança só pensava em ser bandido,/Ainda mais quando com um tiro de um soldado o pai morreu”. Tal prática, como todos já sabem, no Brasil, tem transformado a própria polícia em um problema policial.
O segundo problema refere-se à ineficácia do sistema de ensino e ao fracasso do sistema punitivo: “Aos quinze, foi mandado para o reformatório /Onde aumentou seu ódio diante de tanto terror”. Para se chegar ao “reformatório” é porque a escola não emergiu como espaço da descoberta da vida e da cidadania.
O terceiro problema diz respeito ao preconceito étnico: “Não entendia como a vida funcionava discriminação por causa da sua classe ou sua cor”. Portanto, a música denuncia não apenas a condição histórica da manutenção dos negros como pessoas sem oportunidades por conta da cor, mas aponta ainda para uma dupla discriminação: a de classe social, como pobre, e a de etnia, porque negro.
Todavia, a passagem para uma cidade grande não significa mudança para uma vida melhor. Partindo do fato de que, no Brasil, o trabalho, historicamente, não representa uma possibilidade de ascensão social, o indivíduo desqualificado profissionalmente tem que trabalhar duro sem, contudo, conseguir se sobrepor às dificuldades, “E o Santo Cristo até a morte trabalhava / Mas o dinheiro não dava pra ele se alimentar”. Esse é um cenário cotidiano de muitos jovens (desempregados ou sub-remunerados). Em síntese, ao longo da música fica implícita as precárias situações da vida no interior brasileiro: um lugar sem oportunidades e, invariavelmente, sem leis.
Na sequência da música, o personagem central busca adquirir, por meio de trabalhos precários. Nesse ponto, temos uma reconstrução do cenário dos centros urbanos onde persiste o fenômeno da violência. A música termina com a morte do personagem João de Santo Cristo, o que denota uma derrota do migrante que ganha a vida na metrópole. Na música, ele é inteiramente tragado pela violência, pelo trabalho precário, pelas drogas. Diríamos ainda, sobretudo, pela ausência de políticas públicas que assegurem aos cidadãos uma vida digna, seja no campo ou nas grandes cidades.
Dijaci David de Oliveira é doutor em sociologia pela Universidade de Brasília e professor da Faculdade de Ciências Sociais da UFG.