Por Mino Carta
O massacre amazônico espanta o mundo. Os jornais europeus e norte-americanos dedicam manchetes aos terrificantes eventos do remoto Brasil, cada vez mais remoto. Não percebem que a barbárie tem sua origem, definida e detectável. Comovem-se com a chance de multiplicar as tiragens e as audiências.
O golpe de 2016, que leva ao poder um governo ilegítimo e celebra a falência das instituições, não logrou despertar o mesmo interesse da mídia internacional. É o momento das cabeças cortadas, e não são aquelas de Luís XVI e Maria Antonieta.
Não esperemos, ao menos por ora, por maiores atenções por parte de quem é incapaz de se dar conta da singularidade brasileira, de um país, de resto, onde há muito tempo a criminalidade mata mais do que a guerra civil na Síria. Mas não seria a nossa, também e a seu modo, uma guerra civil? E quem haveria de importar-se, se os próprios brasileiros não se importam?
A barbárie começa pela traição cometida pelos donos do poder em relação às dádivas com que a natureza nos premiou como nenhum outro país. E não é barbárie a indiferença de ricos e remediados diante da miséria que os rodeia? E não o são as condições deploráveis da saúde e da educação públicas? Ou, para chegar ao detalhe, não é barbárie o sofrimento de metade da população privada até hoje de saneamento básico?
A barbárie está no singular, maligno golpe de 2016 e nos resultados, no desastre institucional, no comportamento de uma mídia entregue à propaganda em lugar do jornalismo. E bárbaro é o caos em que os golpistas nos mergulharam, a névoa cada vez mais densa a nos cercar. É tanta barbárie que, na qualidade de campeões mundiais da criminalidade, em pleno caos certamente elevaremos nossos índices terrificantes.
E não são bárbaros os juros de 14% para fazer do Brasil o paraíso da usura enquanto a indústria implode? E não é bárbara a rendição ao mais torpe neoliberalismo? E que dizer da ignorância geral e irrestrita, do ódio de classe, da impossibilidade de diálogo, do racismo negado embora evidente?
Nossa bárbara unicidade, nossa inexorável medievalidade são próprias do país onde, a rigor, a dicotomia direita-esquerda nunca teve sentido. A verdadeira é outra, casa-grande e senzala.
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